Fábrica de aprendizagem

Ana Correia Simões

  (1)INESC TEC

António Henrique Almeida

  (1)INESC TEC

Américo Azevedo

  (1)INESC TEC

  (2)Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto

Experienciar para aprender num ambiente quase real - o princípio facilitador da compreensão e ação no contexto das fábricas do futuro.

 

Uma tendência sem retorno é a digitalização da indústria. Abordar as diferentes dimensões subjacentes à digitalização é um desafio tanto para o meio académico/investigação como para a indústria. Os desafios mais relevantes são:

1. Assegurar a disponibilidade de mão-de-obra qualificada.

2. Sensibilizar e compreender os custos-benefícios reais da adoção de soluções digitais.

3. Garantir a eficácia no desenvolvimento de iniciativas capazes de transformar as organizações. Do lado da indústria encontramos dois grupos de empresas distintos. Por um lado, temos as grandes empresas com o seu poder interventivo e disponibilidade de recursos, capazes de lançar amplas iniciativas de teste, avaliação e implementação das tecnologias e de práticas operacionais e organizacionais, de forma a manterem a sua posição competitiva no mercado. Do lado oposto temos as pequenas e médias empresas (PME), normalmente dispondo de recursos escassos, atuando numa base de nicho regional e sem uma orientação estratégica da evolução do negócio. Estas empresas acabam por ter uma atitude reativa, muito sustentada na necessidade de sobrevivência nos mercados onde atuam.

As PME são o pilar das economias portuguesa e europeia. Estas empresas representam uma importante fatia das empresas industriais quando comparadas com as empresas de grande dimensão, contabilizando cerca de dois terços (68,4%) do valor acrescentado global e cerca de três quartos (78%) do emprego (2). Assim, atividades de investigação e mecanismos competentes de transferência de conhecimento são obrigatórios para uma bem sucedida implementação das tecnologias e conceitos da Indústria 4.0 nas PME (3). Consequentemente, e apesar das estratégias de digitalização poderem trazer oportunidades excecionais de competitividade às empresas, a implementação da transformação digital nas PME não é livre de risco nem é um processo simples.

Um obstáculo chave no processo de digitalização é a falta de conhecimentos dos agentes de decisão relativamente ao potencial e impacto/implicações das tecnologias digitais. Alguns agentes de decisão abdicam/rejeitam a transformação digital simplesmente porque não compreendem como é que essas tecnologias podem ser incorporadas no seu negócio [1]. Assim, institutos de investigação, clusters industriais e Polos de Inovação Digital (Digital Innovation Hubs) são responsáveis por construir as infraestruturas e disponibilizar os serviços que irão progressivamente mudar esta mentalidade (por exemplo serviços de análise de maturidade e elaboração de roadmaps tecnológicos). As empresas poderão usufruir de ambientes de demonstração e aplicação de tecnologias emergentes i4.0 seguindo uma metodologia iterativa e suportada pelo espírito de confiança e de colaboração com as entidades do sistema científico e tecnológico nacional.

Tendo em consideração esta realidade e ambição, especialmente entre as PME portuguesas, são necessários programas de formação e laboratórios inovadores para a demonstração e experimentação das tecnologias em cenários “quase reais” (4). Estas ferramentas e infraestruturas têm de ser flexíveis para se adaptarem a todos os níveis hierárquicos das empresas e estruturas organizacionais, desde gestores até ao pessoal técnico. Esta visão está pautada no desenho e desenvolvimento do Industry and Innovation Lab (iiLab) do INESC TEC – uma “fábrica de aprendizagem” da Indústria 4.0. Esta infraestrutura adaptada permite a instalação de tecnologias digitais num modelo de plug & play para promover a demonstração de tecnologias com um baixo custo e esforço. Deste modo, podem ser prestados novos serviços, onde as PME interessadas em avaliar a adoção de novas tecnologias e justificar o retorno do investimento podem fazê-lo com apoio de uma equipa multidisciplinar de investigadores e uma rede de fornecedores de tecnologias criteriosamente selecionada.

Adicionalmente, os programas orientados para os agentes de decisão estão a ser desenvolvidos e oferecidos numa metodologia de formação ativa, firmemente alicerçada no conhecimento mais recente do estado-da-arte e apoiado por casos de referência, experimentação e aplicações reais. Durante estas sessões de formação pretende-se que os formandos se familiarizem com um leque alargado de conceitos, princípios, metodologias e ferramentas capazes de reforçar significativamente a sua capacidade de tomada de decisões quer ao nível estratégico quer ao nível operacional.

Estes programas têm um âmbito multidisciplinar, explorando diferentes tópicos e áreas temáticas transversais, orientados para a Indústria 4.0 e o paradigma da transformação digital. Os tópicos abordados estão relacionados com a avaliação da maturidade, fábricas inteligentes e sistemas de produção flexíveis, big data e inteligência artificial para a tomada de decisão na indústria e novos processos de produção para novos modelos de negócio. Na mesma linha, os programas de formação orientados à tecnologia têm sido desenvolvidos para responder às necessidades de requalificação de operadores e alavancagem da adoção de novas tecnologias na indústria transformadora. Por exemplo, nestas formações são explorados tópicos como automação cognitiva, realidade aumentada e virtual, robótica industrial e colaborativa, visão artificial, internet das coisas aplicada à indústria (IIoT) e interoperabilidade, entre outras tecnologias.

Com o objetivo de tornar esta visão uma realidade, o INESC TEC tem definido uma estratégia de se envolver num conjunto de projetos educacionais no âmbito de projetos do EIT Manufacturing e outros que servem como base de desenvolvimento e melhoria contínua de programas de formação do iiLab. A ideia subjacente a estes projetos educacionais é: produzir uma gama alargada de atividades educacionais, focadas nos mais avançados processos e em tecnologias de produção orientadas às tecnologias de informação, dar apoio às universidades, dar formação avançada, e desenvolver atividade de Investigação e Desenvolvimento (I&D) e de transferência de tecnologia para diferentes audiências.

Referências

1. J. Reis, M. Amorim, N. Melão, and P. Matos, (2018) Digital transformation: A literature review and guidelines for future research, In: Rocha Á., Adeli H., Reis L.P., Costanzo S. (eds) Trends and Advances in Information Systems and Technologies. WorldCIST'18 2018. Advances in Intelligent Systems and Computing, vol 745. Springer, Cham. https://doi.org/10.1007/978-3-319-77703-0_41.

2. European Commission (2019), “SBA Fact Sheet: Portugal”, Brussels

3. D. Horváth and R. Z. Szabó, (2019) Driving forces and barriers of Industry 4.0: Do multinational and small and medium-sized companies have equal opportunities?, Technological Forecasting and Social Change, 146, 119-132, https://doi.org/10.1016/j.techfore.2019.05.021.

4. Abele, E., J. Metternich, and M. Tisch. (2019) Learning Factories: Concepts, Guidelines, Best-practice Examples. Basel: Springer International Publishing.