(1)Investigador Sénior, INESC TEC
(2)Investigadora Sénior, INESC TEC
A transição para uma indústria circular e neutra em carbono coloca imensos desafios para o setor, mas também oportunidades - mais flexibilidade, maior disponibilidade de energia local e menor dependência dos mercados voláteis de combustíveis fósseis e eletricidade. Para beneficiarem plenamente destas oportunidades, as empresas precisam de considerar a otimização dos planos de produção a par de melhorias na eficiência energética. Novas ferramentas digitais, tais como o planeamento e programação avançada multiobjectivo, podem ser particularmente úteis ao proporcionarem um compromisso entre otimização do planeamento das datas de entrega e a minimização do consumo global de energia.
O mundo de amanhã, hoje
A transição energética traz consigo a promessa de um mundo mais inteligente, mais verde, mais justo e (quase) livre de desperdício. No entanto, isto exigirá uma revolução das nossas economias, pois 80% da energia mundial é fornecida por carvão, petróleo, e gás natural - que, com poucas exceções, são maioritariamente importados.
Ao nível da UE-27, a transição visa reduzir os níveis de emissões de gases com efeito estufa (GEE) em 50% nos próximos 10 anos, e alcançar a neutralidade carbónica até 2050. Em teoria a estratégia principal parece simples - descarbonização da produção elétrica e de calor, acompanhada da eletrificação dos usos energéticos nos edifícios, nos transportes e na indústria. Estão também previstas estratégias sectoriais adicionais tais como o hidrogénio verde para a indústria e os transportes de longo curso, e a captura e a utilização de carbono para emissões de processos industriais.
O futuro (sustentável) da indústria
A indústria, com a sua estrutura heterogénea - alguns sectores são concentrados em grandes empresas, enquanto outros são mais fragmentados, com muitas pequenas e médias empresas (PME) -, e a variedade de produtos, processos e sistemas de produção, enfrenta desafios consideráveis para atingir a descarbonização total e a eletrificação em larga escala.
Metade da energia térmica destina-se a processos a altas temperaturas que atualmente têm um potencial limitado de descarbonização. A outra metade tem opções mais alargadas, incluindo integração direta de solar térmico e bombas de calor para temperaturas baixas, e sistemas a hidrogénio e bioenergia para temperaturas médias. Notavelmente, 20% a 30% da produção de calor é perdida como calor residual, existindo um potencial significativo de melhoria imediata da eficiência energética através da recuperação e da reutilização deste calor.
Embora existam poucas opções comerciais para as tecnologias baseadas no hidrogénio e abordagens limitadas para o calor de altas temperaturas, para os restantes usos de calor já existem alternativas comerciais viáveis que poderiam contribuir significativamente para a transição energética industrial, através da recuperação e reutilização de calor desperdiçado, da integração de energias renováveis locais – solar fotovoltaica ou térmica -, e da utilização de bombas de calor.
Este novo ecossistema de baixo carbono permitirá reduzir a dependência dos preços voláteis dos combustíveis fósseis e da eletricidade, reduzir os custos operacionais da energia, e aumentar a disponibilidade de ativos flexíveis (por exemplo, armazenamento térmico e elétrico, bombas de calor, eletrolisadores). No entanto, exigirá novas ferramentas digitais que permitam uma melhor gestão da crescente variabilidade e flexibilidade dos sistemas energéticos industriais.
This new ecosystem of low-carbon options will also allow lower dependence on volatile fossil fuel and electricity prices, reduce operational energy costs, and increase the availability of flexible assets (e.g., thermal and electrical storage, heat pumps, electrolysers). Moreover, it will require a new generation of digital tools to allow better management of the increasing variability and flexibility of local industrial energy systems.
O custo da energia na indústria
A energia, tradicionalmente considerada um custo indireto na indústria, coloca agora desafios a quem dela depende para produzir bens, devido aos seus custos crescentes e à variabilidade no tipo (solar, elétrico, gás, etc.) e oferta (previsões de produção de energia solar, perfis de custos diários de energia elétrica, Etc.). Para se manterem competitivos nos mercados regionais e globais, os gestores necessitam de encontrar formas de equilibrar os custos operacionais com a rentabilidade, tarefa especialmente difícil para PMEs.
Eficiência operacional vs uso eficiente de energia
As empresas industriais têm feito esforços significativos para melhorar a sua eficiência operacional, atuando nas áreas de manutenção preditiva, minimização dos tempos improdutivos, atualização da formação de recursos humanos e seleção e uso adequado de sistemas manufacturing execution system (MES), enterprise resource planning (ERP) e ferramentas de planeamento e escalonamento.
A eficiência energética é alcançada através do uso de máquinas e equipamentos auxiliares mais modernos, mais produtivos e eficientes, embora melhorias adicionais possam ser conseguidas usando ferramentas de planeamento e escalonamento. A grande maioria das PME não tem capacidade para renovar todos os seus recursos produtivos e encontramos frequentemente, no chão de fábrica, gerações distintas de máquinas capazes de produzir os mesmos produtos e as suas variantes.
Máquinas mais rápidas e energeticamente mais eficientes são, frequentemente, mais complexas de configurar. Para conseguir dar resposta às encomendas de clientes, todas as máquinas, antigas e novas, necessitam de ser usadas a tempo inteiro.
Que condições necessitamos de criar para obter planos de produção (alocar e sequenciar ordens de produção nas máquinas) que sejam otimizados na qualidade de resposta aos clientes e, ao mesmo tempo, usem a energia de forma eficiente?
Desafios para alcançar a eficiência energética na indústria
O desenho e a implementação de modelos e políticas de aquisição e gestão de dados que suportem a tomada de decisões constituem pilares fundamentais para atingir a eficiência operacional e energética. As plataformas de ´Internet of Things (IoT) permitem adquirir e tratar os dados originários do chão de fábrica. As empresas industriais precisam de conhecer melhor os seus produtos e sistemas produtivos.
Um plano de produção globalmente otimizado para a qualidade de serviço ao cliente e para o uso eficiente de energia não estará, frequentemente, otimizado ao nível (local) da máquina. Precisamos de formar os operários que, muitas vezes, têm dificuldade em entender porque é que as ordens de fabrico a produzir nas suas máquinas não estão agora ordenados adequadamente, na sua opinião.
Precisamos de implementar, logo que e tanto quanto possível, flexibilidade nos momentos em que operações são realizadas, dependendo da disponibilidade de energia e das suas tarifas. Sem essa flexibilidade, não haverá liberdade suficiente para obter melhores soluções.
Oportunidades que resultam do conhecimento do sistema de produção e da utilização adequada da oferta de energia
A capacidade de caracterizar corretamente as características de consumo de energia dos processos e dos sistemas de produção, juntamente com informação sobre a procura atual e futura dos produtos e da oferta e dos preços de energia, permitirá o uso de ferramentas como o Advanced Planning and Scheduling (APS) para obter soluções otimizadas
O perfil de consumo de energia que resulta dessas soluções otimizadas potenciará uma negociação mais sustentada das compras de energia e valorizará também o papel da empresa nas comunidades de energia renovável.
As empresas industriais poderão, assim, aumentar as suas margens e/ou ser mais competitivas. Serão igualmente mais resilientes e conseguirão lidar com a variabilidade, adaptando os seus planos de produção.